terça-feira, 27 de setembro de 2011

Jesus: um apaixonado por Deus e pelas pessoas por Francisco Orofino

Na visão do biblista Francisco Orofino, Jesus veio mostrar que todos nós podemos nos tornar divinos. Mas o caminho de nossa divinização exige de nossa parte a mais profunda humanização.
Por: Graziela Wolfart

“Creio que sempre é difícil para alguém perceber que sua proposta de amor, perdão, justiça, igualdade e fraternidade encontrou uma grande resistência por parte daqueles que falam e agem em nome de Deus. Jesus fez, antes de tudo, um enfrentamento religioso com as autoridades religiosas de sua época. E isso nunca é fácil. Ele teve que enfrentar a religião institucional nos lugares em que passava, defendendo as pessoas marginalizadas pela religião. Quando será que ele chegou à conclusão de que as práticas religiosas de seu tempo afastavam as pessoas de Deus? E que a Teologia oficial legitimava a exclusão de grande parte do povo dos serviços religiosos no Templo? E, uma vez tendo chegado a estas conclusões, quando será que ele decidiu partir abertamente para o confronto (cf Lc 9,51)? Tais conclusões com as respectivas atitudes práticas também não foram fáceis para Jesus”. A reflexão é do teólogo biblista Francisco Orofino. Na entrevista que segue, concedida por e-mail à IHU On-Line, ele afirma que, sem dúvida, o momento mais difícil na vida de Jesus “foi perceber para onde este confronto desigual o estava conduzindo e, mesmo assim, sabendo que havia uma cruz na virada do caminho, manter-se fiel ao projeto de Deus e às esperanças daqueles e daquelas que o seguiam, sem cair na tentação de fugir”. E acrescenta: “a grande escola de Jesus foi a casa familiar, a Palavra na comunidade e a história de seu povo vivida numa época de grande turbulência social, política e religiosa”.

Francisco Orofino ministra aulas para leigos no Seminário Paulo VI, em Nova Iguaçu, Rio de Janeiro. É também biblista e educador popular. Assessora grupos populares e comunidades de base nos municípios da Baixada Fluminense. É autor de vários livros e leciona em Institutos de Teologia voltados para a formação de leigos. É assessor nacional do CEBI (Centro de Estudos Bíblicos). Fez doutorado em Teologia Bíblica na PUC-Rio (2000).

Confira a entrevista.

IHU On-Line - Como o senhor descreve o processo de aprendizagem de Jesus, na condição de ser humano?
Francisco Orofino - Temos que entender o processo de aprendizado de Jesus dentro da vida cotidiana de uma aldeia da Galileia no primeiro século da Era Cristã. Ao nascer, uma criança pertencia à mãe. A mãe era a única professora, catequista, mestra que uma criança tinha. Assim, competia à mãe ensinar a língua, a religião, as tradições religiosas, as tradições familiares, enfim, tudo que fosse importante na vida daquela criança: andar, falar, comer, vestir-se, conviver, rezar, trabalhar, pensar... Temos que entender que a formação de Jesus começa em casa, e sob forte influência materna. Jesus viveu muito tempo neste ambiente familiar e comunitário. E neste ambiente comunitário, profundamente religioso, a leitura e a vivência da Palavra eram muito importantes. Se de fato Jesus sabia ler e escrever, deve-se à escola dos escribas que funcionava junto às sinagogas. Mas a vida familiar de Jesus é muito conflitante. Depois que começou sua itinerância, os parentes pensam que ele ficou maluco e queriam que ele voltasse para casa (cf. Mc 3,20-21). Nazaré era uma pequena aldeia, com horizontes muito limitados e fortes preconceitos. Jesus deve ter sido motivo de vergonha para alguns de seus parentes. Não sabemos exatamente quando Jesus saiu de Nazaré. O evangelho de Marcos insinua que ele teve moradia em Cafarnaum (Mc 2,1). De qualquer forma, os evangelhos são unânimes em dizer que a vida pública de Jesus começa depois que João Batista foi preso. Isso mostra que a inserção de Jesus nos movimentos populares proféticos de sua época, como o movimento do Batista, foram importantes em sua formação humana. Em resumo, a grande escola de Jesus foi a casa familiar, a Palavra na comunidade e a história de seu povo vivida numa época de grande turbulência social, política e religiosa.

IHU On-Line - Quais os fatos históricos mais significativos dos 30 anos de Jesus em Nazaré?
Francisco Orofino - Creio que os fatos históricos mais significativos na vida de Jesus estão relacionados com a ocupação romana e a administração herodiana feita em nome de Roma. Logo após a morte de Herodes, o Grande (4 aC) explodiram muitas revoltas na Judeia e na Galileia. Este clima de violências e de revolta vai durar até a grande guerra judaica contra Roma, entre 66 e 73 d.C. Portanto, Jesus viveu um dos períodos de maior turbulência política e religiosa da história da Palestina. Quando da grande revolta após a morte de Herodes, a capital da Galileia, Séforis, distante uns 8 km de Nazaré, foi totalmente arrasada e sua população escravizada. Neste período, em Nazaré, o menino Jesus, “crescia em sabedoria, tamanho e graça diante de Deus e dos homens” (cf. Lc 2,52). Estas revoltas que surgem depois da morte de Herodes mostram que o povo está à procura de um rumo. Surgem muitos líderes apontando a realização das antigas promessas feitas por Deus ao povo ao longo da história. O povo começa a seguir muitos líderes populares como Judas, o Galileu e Teudas (cf. Atos 5,36). Esta movimentação popular aumentará sempre mais a repressão romana. Esta tensão político-religiosa sem dúvida foi marcante na vida de Jesus. Como estes fatos chegavam e repercutiam numa pequena aldeia como Nazaré, fica difícil de dizer e de imaginar. O que podemos deduzir é que num determinado momento de sua vida, Jesus sai de Nazaré e vai trabalhar em Cafarnaum. Pode ter sido mesmo por questões de trabalho e de sobrevivência. Em Cafarnaum tem uma proximidade muito grande com as colônias de pescadores. Dos seus doze apóstolos, cinco são pescadores, provavelmente gente sem instrução. De lá Jesus se insere no movimento popular do Batista. Depois da prisão do Batista, Jesus começa sua pregação. Seus primeiros discípulos também saem do movimento do Batista (cf. Jo 1,37).

IHU On-Line - Quais os momentos mais difíceis vividos pelo Jesus homem?
Francisco Orofino - Creio que sempre é difícil para alguém perceber que sua proposta de amor, perdão, justiça, igualdade e fraternidade encontrou uma grande resistência por parte daqueles que falam e agem em nome de Deus. Jesus fez, antes de tudo, um enfrentamento religioso com as autoridades religiosas de sua época. E isso nunca é fácil. Ele teve que enfrentar a religião institucional nos lugares em que passava, defendendo as pessoas marginalizadas pela religião. Quando será que ele chegou à conclusão de que as práticas religiosas de seu tempo afastavam as pessoas de Deus? E que a Teologia oficial legitimava a exclusão de grande parte do povo dos serviços religiosos no Templo? E, uma vez tendo chegado a estas conclusões, quando será que ele decidiu partir abertamente para o confronto (cf Lc 9,51)? Tais conclusões com as respectivas atitudes práticas também não foram fáceis para Jesus. Mas, sem dúvida, o momento mais difícil foi perceber para onde este confronto desigual o estava conduzindo e, mesmo assim, sabendo que havia uma cruz na virada do caminho, manter-se fiel ao projeto de Deus e às esperanças daqueles e daquelas que o seguiam, sem cair na tentação de fugir.

IHU On-Line - Qual a importância do sofrimento humano de Jesus para a compreensão de sua divindade?
Francisco Orofino - A palavra que geralmente define este sofrimento humano de Jesus é a palavra “paixão”. Ora, nos relacionamentos humanos, a palavra “paixão” é muito positiva. Define um sentimento gostoso e intenso. Quem já sentiu e viveu uma grande paixão sabe disso. Como canta Vinicius de Moraes “quem nunca curtiu uma paixão, nunca vai ser nada não!” Ora, a palavra “paixão” relacionada a Jesus toma uma conotação negativa, de sofrimento doloroso. E de um sofrimento necessário e pedido por Deus. Como se Jesus só poderia demonstrar sua divindade assumindo o sofrimento humano. Eu penso que temos que recuperar a palavra “paixão” em Jesus de maneira muito positiva: Jesus era antes de tudo um apaixonado por Deus e pelas pessoas. E trouxe, em seus gestos e palavras, uma proposta de um Deus amoroso e apaixonado. E aqui temos que entender a dor de Jesus. Nada dói mais do que a gente perceber que nossa proposta de amor apaixonado está sendo rejeitada pela pessoa amada. Como lembra o evangelho de João: “veio para os seus, mas os seus o rejeitaram!” (cf. Jo 1,11). Rejeição dói. Rejeição de um amor livre e gratuito dói mais ainda. Manter-se fiel a este amor, mesmo se sabendo rejeitado, revela algo do rosto divino de Jesus.

IHU On-Line - Quais as características humanas mais interessantes de Jesus?
Francisco Orofino - Creio que a principal característica humana de Jesus era a de ele ser uma pessoa absolutamente normal. Jesus não era um asceta, como esperamos de qualquer líder religioso. Ele não fazia retiros prolongados, nem jejuns penitenciais. Pelo contrário, era um festeiro. Por isso era conhecido como “comilão e beberrão” (Mt 11,19). Este espírito de festa, de acolhida e de convivência, principalmente com as pessoas marginalizadas, deve ter causado muito impacto na vida das pessoas simples da época. É como se Jesus dissesse: é impossível ser amigo desta gente toda e ao mesmo tempo ser conivente com o sistema religioso que os marginaliza. Esta cordialidade de Jesus para com todos, especialmente com as mulheres, causou estranheza nos próprios discípulos (Jo, 4,27).

IHU On-Line - Como podemos entender melhor as frases “Jesus é humano, muito humano, ‘tão humano como só Deus pode ser humano’” (Papa Leão Magno); e “Ele veio nos mostrar o caminho para quem quer ser divino: antes de tudo ser profundamente humano!”. (Fl 2,6-11)?
Francisco Orofino - Estas frases querem nos ajudar a entender o mistério da Encarnação de Jesus. Desde a revelação de Deus a Moisés no Sinai (Ex 3,7) fica claro que na proposta religiosa judaico-cristã não é o ser humano que se eleva, mas é Deus que desce. E esta descida de Deus, que atinge seu ponto máximo na encarnação de Jesus, é provocada pelo grito do pobre, do marginalizado, do excluído, do escravizado. A mais antiga reflexão que temos sobre a encarnação de Jesus é o hino que Paulo transcreve na carta aos filipenses. Paulo constata que o movimento natural dos seres humanos é querer ascender, atingir o topo, suplantando todos ao redor. Ao apresentar o hino, Paulo lembra que Jesus estava no topo. Era de condição divina. Mas não se apega a esta posição e começa a descer. E esta descida só acaba na execração pública da crucificação. Mas baixo do que isso, impossível. Mas é exatamente quando Jesus atinge este ponto máximo de humilhação que o Pai o exalta e o eleva. Fica claro então os inúmeros paradoxos de Jesus: “quem quiser ganhar a vida vai perder... quem souber perder a vida por amor, vai ganhar...” (cf. Mc 8,35 e paralelos). Jesus veio mostrar que todos nós podemos nos tornar divinos. Mas o caminho de nossa divinização exige de nossa parte a mais profunda humanização. Temos que nos abrir para a convivência com os outros. Para Jesus, mais importante que o relacionamento com Deus é o relacionamento com as pessoas. Este deve ter sido um dos pontos centrais na pregação de Jesus. Assim registra de maneira radical a Primeira Carta de João: quem não ama seu irmão é assassino! (1Jo3,15).

terça-feira, 13 de setembro de 2011

A fé como produto ---> Pe. Zezinho, scj

Em várias igrejas cristãs, mercê de uma catequese imediatista que privilegia o sentir, mais do que o estudar, o aprender e o compreender cresceu o número de pregadores que dicotomizam a fé entre o bem e o mal. Não há "pode ser" nem "talvez". Trabalham com o certo e o absoluto. Tudo é anjo ou demônio, tudo é oito ou oitenta, tudo é Deus e anti-Deus. Entre São Paulo e Rio de Janeiro há pelo menos vinte cidades onde se pode morar com razoável conforto. Quem achasse que só se pode morar ou em São ou no Rio de Janeiro demonstraria incapacidade de assimilar a realidade.

São eles que em plena televisão ou congresso, quando apaga a luz atribui o fato ao inimigo, quando volta a acender após as preces que um deles comanda atribuem a volta a luz aos anjos. Recentemente um pregador olhou insistentemente o relógio de pulso que parecia não funcionar. A invés de ignorar o fato, dramatizou. Pôs a culpa no maligno, tirou o relógio do pulso e o jogou para os bastidores. O maligno estaria prejudicando sua pregação ao fazer parar o seu relógio de pulso. Outro atribuiu a epidemia da dengue ao demônio da dengue que comandava os mosquitos para levarem a doença aos lares. Solenemente expulsou-o do Brasil.

Os fatos se multiplicam e se repetem. Pior em tudo é que muitos que assim fazem estudaram teologia, mas resolveram praticar uma fé mágica que vê anjos onde não há e demônios onde nunca houve. Supersimplificam a vida decidindo que o que prejudica os fiéis é do demônio e o que faz bem é dos anjos e do céu. Assim, o câncer é obra do demônio e a cura é obra do céu, exceto quando um deles fica enfermo. Aí, é provação do céu, porque o demônio não poderia ferir quem já é do Cristo.

Sua visão de Cristo foge à teologia num flagrante sinal de que não estudaram a matéria. Garantem que têm visões e revelações especiais e veiculam isso pela imprensa. Garantem curas que, não verificadas ficam por isso mesmo. E houve aquele que disse que somos cristãos porque somos filhos do Cristo. Disse também que amor filia é o mesmo que amor filial. Como ninguém contesta, tais pregações prosseguem.

Um dizia que o rock não pode ser musica cristã porque é som do demônio, outro afirmava que determinada canção muito cantada entre católico, se tocada de trás para frente era um louvor a satanás. E houve aquele que garantiu que Maria não tem poder nenhum porque ela está dormindo à espera da ressurreição, mas que seu pregador preferido opera milagres com um simples toque. Aleluia! O pregador daquela igreja está salvo e tem mais poder do que a mãe de Jesus que está morta e ainda não chegou ao céu! A conclusão é óbvia: para ele Jesus tem poder só na terra, mas não tem depois da morte porque é incapaz de levar até a mãe dele para o céu! Um trecho de Paulo lhe garante que o céu só se abrirá no ultimo dia da humanidade. Esqueceu os outros trechos da mesma Bíblia que falam de salvação imediata e que dizem que Jesus tem todo o poder no céu e na terra...

É claro que o fiel que vê alguém jogar fora óculos, cadeira de rodas e muletas ao som de uma prece escolherá esta igreja, e não a outra na qual o pegador manda pensar e diz que o milagre não tem hora nem lugar marcado para acontecer. Entre o milagre que pode acontecer, mas não se sabe quando porque é Deus quem decide operar e aquele que garantidamente acontece no culto das 20h e no do sábado, o fiel que busca resultado vai lá onde milagres acontecem ao comando de um pegador poderoso em obras e palavras.

O mundo sempre escolheu o imediato. Esperar é virtude que poucos cultivam. Também não esperam pelo céu. Porque sentar-se à espera de uma refeição que demoraria 30 minutos se ele pode encomendar um prato feito em dois ou três?

A fé do prato feito, imediata tomou conta de inúmeras igrejas. Do restaurante de comida boa, mas cujas refeições demoram, muitos mudam para o restaurante ao lado que servem na hora comida quentinha. Quem serve mais depressa ganha a freguesia. Exceto quando a freguesia descobre o valor do diálogo à mesa e sabe que refeição não é só questão de comer e saciar-se. Pode ser ágape! Mais do que comer é estar juntos!
Cont.
www.padrezezinhoscj.com

sábado, 3 de setembro de 2011

Grito dos Excluídos 2011


Em sua 17ª edição, o Grito tem por tema: Pela Vida grita a TERRA… Por direitos todos nós! As catástrofes ambientais, conseqüência do desequilíbrio causado pelo modelo de produção vigente do sistema capitalista, a miséria e a pobreza, a concentração de riquezas e exploração irresponsável dos recursos naturais, são gritos por cuidado, justiça e dignidade que ecoam mundo afora.
O Grito dos/as Excluídos/as pretende levar às ruas o grito da Mãe Terra sofrida com tantos projetos de morte, os quais, escondidos atrás das máscaras do desenvolvimento, destroem a natureza e colocam em risco toda espécie de vida sobre o Planeta. Conseqüência também desse modelo de desenvolvimento capitalista, que visa tão somente o lucro desenfreado de alguns poucos, é a negação dos direitos básicos da população: saúde, educação, moradia, acesso à Terra, à Água, lazer, cultura, emprego, soberania alimentar… O governo anuncia o ascenso de 35 milhões de pessoas à classe média, porém, isso não significa que os direitos básicos destes e dos que continuam a linha de pobreza e miséria tenham sido garantidos.
Por isso, o Grito dos Excluídos defende: Pela vida, grita a Terra... Por direitos, todos nós! Trata-se da manifestação dos trabalhadores e trabalhadoras frente às ameaças que colocam em risco a natureza e o ser humano. Segundo os organizadores do Grito, é necessário que as vésperas da Rio +20 as organizações populares dos diversos setores se posicionem sobre estes temas tão importantes.
O Grito dos Excluídos é um evento nacional, e em 2011 celebra sua 17ª edição. É uma manifestação popular carregada de simbolismo, é um espaço de animação e profecia, sempre aberto e plural de pessoas, grupos, entidades, igrejas e movimentos sociais comprometidos com as causas dos excluídos.